Daniel adorava ajudar seu pai no trabalho, mas
sempre depois da escola. Hoje, contudo, chegaria mais cedo: a água da escola
amanheceu suja e não foi possível fazer a merenda. A caixa d´água da escola
tinha sido pintada há poucos dias e parece que isso tinha sido a causa do
problema, explicou dona Esperança, a professora do menino.
Quem adorou que Daniel saiu mais cedo da aula
foi Sapeca que, como sempre, estava lhe esperando na esquina da escola. Enquanto
voltavam Daniel jogava uma bolinha de borracha para frente e o cachorrinho corria
para apanhá-la. Difícil era fazer Sapeca devolver o objeto para que o menino pudesse
lançá-lo outra vez.
Quando já estava quase no trabalho do pai, seu
João Antunes era o funcionário da prefeitura encarregado de reformar o lixão da
cidade de Flora do Sul, Daniel percebeu que ia começar a chover: o céu estava
cinza.
Então, quando o barulho dos trovões ficou mais
forte, o garoto chamou sua cachorrinha para se protegerem da chuva. O abrigo
mais próximo era um ponto de ônibus do outro lado da rua. Até chegarem lá,
Daniel sabia que iria se molhar um pouco. Eles, correram, correram e,
finalmente, chegaram no ponto de ônibus: coloridos! Ele e Sapeca tinham sido
molhados por pingos de chuva de várias cores. Curioso, o menino olhou para o
céu e viu uma coisa incrível: uma porção de bolinhas voadoras e coloridas que bebiam
um pouquinho da água dos pingos de chuva. A água do pingo que não era engolida
por elas e ficava colorida assim que estes encostavam suas boquinhas nela; daí,
caíam pintando as coisas.
Lá no alto, as tais bolinhas pareciam realmente muito
pequenas, mas Daniel não precisa vê-las de perto para ter certeza: eram os
mesmos bichinhos que ele e o senhor Engenho tinham visto quase um ano antes. O
estranho era que daquela vez, os bichinhos comiam e coloriam o lixo, não água.
O menino percebeu outra coisa que não se
lembrava: as bolinhas não só pintavam tudo aquilo em quê a boquinha delas
encostava; as próprias criaturinhas ficavam mudando de vermelho para azul,
amarelo, verde, laranja, violeta... Enfim, um montão de cores. Sapeca latia
como louco para aquele desfile de cores no céu.
Quando já estavam satisfeitas de beber água, as
bolinhas coloridas saíram voando, bem para onde Daniel e o cachorrinho Sapeca
estavam indo: o lixão. Os dois foram atrás. O lixão de Flora do Sul era enorme!
Todo o lixo da cidade era despejado ali; e o prefeito da cidade tinha pedido ao
pai de Daniel melhorasse as condições do lugar. Não era bom para a saúde das pessoas
que o lixo ficasse a céu aberto. Outro problema é era que o lixão não parava de
crescer e mais terrenos da cidade eram perdidos para receber o lixo.
Correndo atrás dos bichinhos voadores e
coloridos, o menino e seu cachorinho foram parar na parte mais distante do
lixão; seu pai e os outros funcionários do lugar não costumavam trabalhar por
ali. O garoto ficou contente, pois era a chance de rever seu amigo, PP, um
urubu que quando filhote abandonado que ele há algum tempo. Não demorou para
Daniel avistar, lá no alto, uma imensa família de urubus, PP, tinha muitos amigos
e amigas. Mesmo quando todos eles estavam no chão, separando alguma coisa para
comer, não se incomodavam com a presença de Daniel, pois sabiam que ele não
lhes faria mal.
Além de uma excelente visão que o permitia ver
coisas no chão quando estava em alturas incríveis, PP também tinha um ouvido
fantástico. Bastou Daniel usar seu assobio secreto que só urubus escutam para que
PP descesse rapidamente do céu e pousasse ao lado de Daniel. O garoto, por sua
vez, passou a mão na cabeça pelada da ave.
Depois falar “oi” para o urubu amigo, Daniel
continuou caminhando rumo ao monte de lixo atrás do qual as bolinhas
multicoloridas tinham desaparecido. Assim que chegou na parte de cima do morro,
o garoto segurou Sapeca para que ele não latisse e ficou espionando as
bolinhas. Os incontáveis pontinhos coloridos andavam pelo lixo comendo-o e
jogando porções de material colorido para todo lado.
Agora Daniel não tinha dúvida, eram mesmo os
bichinhos que tinha visto atacando um caminhão de lixo. Ele só ainda não tinha
entendido porque ele estavam bebendo a água da chuva há alguns minutos atrás.
Então, veio a resposta para mais um porque do garoto. Assim que terminaram de
comer, as criaturinhas começaram a voar.
Lá se foram Daniel e seu cachorrinho atrás dos
pontinhos coloridos para ver o que eles iriam fazer. Os dois atravessaram o
lixão correndo atrás dos bichinhos. Correram, correram e correram. Foram para
tão longe que chegaram a um lugar que Daniel nunca tinha visto: uma lagoa. Bem,
pelo menos era uma até as bolinhas coloridas entrarem nela e beberem quase toda
a água e deixando o que sobrou sujo, mal cheiroso e com um monte de cores.
Daniel tinha aprendido na escola que a água boa é sem cheiro, sem sabor e sem
cor.
Foi então que o menino percebeu uma coisa bem
ruim sobre os bichinhos: toda vez que eles cominham lixo, ficavam com muita
sede e precisam de água, muita água. E o que eles deixavam de beber ficava
sujo, polúido, com muitas cores e mal cheiro. Foi então que Daniel percebeu o
que aconteceu na caixa d´água da escola; não tinha a pintura dela, mas os
bichinhos coloridos que comiam lixo! Também foi por causa daquela baita sede
que elas beberam e sujaram a chuva! Aquilo era terrível, tinha tanto lixo
jogado por aí que os bichinhos podiam acabar bebendo e sujando toda água dos
lagoas, lagos, córregos, riachos, rios, mares e oceanos do mundo!
Depois de acabaram com sua sede na lagoa os
bichinhos começaram a voar rumo ao lixão; iam começar tudo de novo! Daniel
tinha de dar um jeito. Ele e Sapeca também voltaram para o depósito de lixo
correndo o mais rápido que podiam; Sapeca com suas quatro patinhas que corriam
como oito, ia sempre na frente.
Chegando lá, o menino teve uma ótima ideia:
enquanto as bolinhas coloridas estavam comendo no fundo do lixão, ele começaria
a esconder o lixo das outras partes do lugar para que os bichinhos ficassem sem
refeição e parassem de beber e sujar tanta água.
Ele decidiu começar pela área que ficava perto
do depósito de materiais da prefeitura usado pelo seu pai e que ficava dentro
do lixão. Mas o quê fazer diante de tantos tipos diferentes de lixo?
_ E aí, Sapeca. O quê nós pegamos primeiro?
O cachorrinho super esperto respondeu puxando um
pedaço de papelão...
“Claro! Papel é mais leve e nós conseguimos
carregar” – pensou o menino.
Assim, ele e Sapeca começaram a pegar todo papel
e papelão que encontravam e a depositar o material em cestos de vime; o
depósito da prefeitura tinha centenas deles. Quando os dois estavam guardando a
última porção de papel e papelão que encontraram, as bolinhas coloridas
começaram a chegar.
O menino se escondeu com seu amigo canino atrás
de uns tambores velhos enquanto as criaturinhas coloridas atacavam todo o lixo
ao redor. Daniel ficou desapontando, pois elas ainda continuavam a comer e
pareciam não estarem sentindo falta de papel e papelão. Muito triste, ele
chegou a imaginar o mundo com toda água colorida e mal cheirosa e os pobres
peixes sofrendo.
Mas de repente, ele percebeu uma coisa nova: as
bolinhas coloridas não estavam mais ficando azuis. Elas continuavam mudando
para o vermelho, amarelo, verdes, laranja, para violeta. Enfim, um montão de
cores; menos o azul! Também não havia mais material de cor azul entre a sujeira
que espalhavam ao redor. A falta de papel e papelão fez com que as bolinhas não
conseguissem mais ficar da cor azul. E não era só isso, agora os bichinhos
coloridos estavam comendo o lixo um pouquinho mais devagar, como se estivessem
também um pouquinho mais fracos. Quando finalmente elas saíram voando, Daniel e
Sapeca foram atrás até um córrego que passava ali perto. Mais uma vez, as
bolinhas começaram a beber água, só que, assim como fizeram em relação ao lixo,
elas também demoravam mais para beber e sujar a água . As criaturinhas
coloridas continuavam bebendo quando Daniel falou:
_ Sapeca, se formos tirando-lhes a comida, essas
criaturinhas ficarão mais fracas e não vão acabar com a água! Vamos deixá-las
aqui bebendo e vamos para o lixão esconder mais coisas.
E lá foram os dois para o lixão. Quando chegaram
a primeira coisa que Daniel fez foi decidir qual o próximo tipo de lixo iria
esconder dos bichinhos: os metais! Sapeca pegava as latinhas menores de
refrigerante ou suco enquanto Daniel apanhava as maiores e mais cumpridas: óleo
de soja, leite em pó e de conservas.
Os dois já tinham juntado muitos objetos de
metal e Daniel foi escolhendo novos cestos de vime para guardá-los. Só que ele
não queria misturar os que já estavam guardando o papel e papelão com os que
ficariam cheios de latinhas; ficaria mais fácil para desocupar os cestos e
devolver tudo para o lixão quando os bichinhos coloridos tivessem ido embora.
Mas como separar aqueles que estavam cheios de papel e papelão dos que estariam
com latinhas?
Aproveitando que seu dono estava pensando num
jeito para separar os cestos, Sapeca começou a cutucar uma latinha de conserva
que tinha uns restinhos de patê. Daniel pensava e o cachorrinho tentava pegar
os restinhos de comida. O menino ainda estava pensando quando ouvi os barulho
das criaturinhas coloridas; elas estavam chegando e ele precisa decidir rápido
como separar as latas do papel e papelão. Os bichinhos estavam chegando mais
perto...e agora?
“Coloridos” – pensou Daniel.
Era isso! Ele foi correndo até a mochila da
escola e apanhou sua aquarela. Por sorte, azul era uma das três cores que
restavam em sua palheta; as outras eram o amarelo e o vermelho. Com a água que
achou dentro de um pneu misturou o azul numa tampinha de garrafa. Se os
bichinhos tinham deixado de acender naquela cor depois que pararam de comer
papel e papelão, Daniel ia usar a mesma cor para marcar todos os cestos de vime
que tivessem cheios desse material.
O menino corria para pintar todos os cestos de
azul e Sapeca abanava o rabinho ao mesmo tempo que mordinha a latinha de patê.
Daí, de vez em quando, ele tentava pegar o próprio rabo como fazia sempre que
estava feliz ou nervoso. O barulho dos bichinhos estava ainda mais forte, pois
eles já estavam quase ali. Daniel correu e, finalmente, conseguiu usar sua
guache azul para colorir todos os cestos. Enquanto seu dono comemorava a nova
forma de identificar os cestos, Sapeca continuava distraído, ora dedicando-se à
latinha de patê, ora tentando morder o rabo.
Agora era só começar a guardar as latinhas
metálicas. Porém, não demorou para que o menino percebesse um problema: o
formato cumprido de muitas das latas fazia com que elas ocupassem muito espaço
e enchessem logo um cesto.
“Puxa, mais um problema!” – pensou.
Mas dessa vez a solução veio rápido e, mais uma
vez, foi o Sapeca quem a trouxe quando Daniel a viu amassando a latinha de patê
com os dentes. Ele retirou todas as latas do primeiro cesto e passou a pisar em
cada uma delas, amassando-as. Agora, achatadas, como uma pizza, as latas
ficaram bem menores e eram necessárias muitas delas para encher um cesto.
Quando ainda faltava metade das latinhas a serem
guardadas os bichinhos coloridos chegaram. Primeiro eles começaram a comer uma
porção de lixo a poucos metros de Daniel e seu cachorrinho. O menino sabia que
precisa ser rápido ou eles comeriam as latinhas que ainda não tinha sido
guardadas. Então, quase sem acreditar, Daniel conseguiu guardar a última
latinha, mas era muito tarde: as criaturinhas coloridas já voavam sua direção. Desesperado,
Sapeca latia tentando espantar os incontáveis bichinhos voadores que cobriam
totalmente seu dono. Dentro do enxame, o pobre garoto esperava de olho fechado
o momento que as criaturinhas começariam a mordê-lo. Ele esperou, esperou, mas
ninguém o mordeu. Depois de alguns segundos elas saíram voando em zigue-zague
como se estivessem tontinhas e se foram. Enquanto partiam, Daniel ainda muito
assustado viu que elas continuavam brilhando em várias cores: vermelho, verde,
laranja, violeta. Enfim, um montão de cores, menos amarelo. Quer dizer, além do
azul que já tinham perdido, agora os bichinhos comedores de lixo tinham parado
de brilhar e sujar também na cor amarela.
E lá foi o Daniel pegar sua cartela de aquarela
e misturar o amarelo com água: todos os cestos com metal seriam pintados
naquela cor. Agora tínhamos cestos azuis para papel e papelão e amarelo para
metais. Quando terminou, ele já sabia o que era preciso fazer. Ser rápido e
começar a separar outro material do lixo.
Mas tinha um problema muito sério, ele estava
muito cansado! E Sapeca também, sua linguinha ia e voltava para fora da boca.
Daniel sabia que precisava de ajuda; precisava chamar o pai que deveria estar
em algum lugar daquele imenso lixão trabalhando. Como ele o encontraria antes
que os bichinhos voltassem? Para ajudá-lo tinha ser alguém capaz de fazer as
coisas voando...
Então ele deu seu assobio secreto que só os
urubus escutam e esperou. Logo, uma manchinha preta surgiu vindo na direção dele.
Ela foi crescendo, crescendo e aos poucos PP foi ficando mais nítido. Quando o
urubu pouso ao lado de Daniel, este lhe fez carinho na sua cabeça sem penas e
disse:
_ Amigo, preciso de sua ajuda. Leve esse bilhete
para meu pai – completou amarrando um bilhetinho de papel na pata do penoso.
E lá se foi o urubu cumprir sua missão. Enquanto
PP buscava ajuda, Daniel resolveu lutar contra o cansaço e continuar a separar
coisas do lixo. Dessa vez, porém, ele não iria pedir ajuda ao Sapeca pois não
queria vê-lo ferido, afinal, agora o material a ser separado era o vidro.
Melhor seria também se ele encontrasse ali no depósito luvas de proteção, mas
não tinha tempo, o menino foi separando com muito cuidado garrafas de bebidas,
potes de produtos alimentícios, copos e todo tipo de frasco de vidro que
encontrava. Sapeca, liberado de suas obrigações, ficou correndo atrás do
próprio rabo, estava contente.
Era preciso ir bem mais devagar, afinal, Daniel
sabia que mexer com vidro era algo perigoso e precisa de muita atenção. O
problema de todo esse cuidado é que ele não teria tempo de guardar todo o vidro
sozinho. Quando os bichinhos comedores de lixo chegassem voando ainda teriam
bastante vidro para comer e, portanto, continuariam a acabar e sujar a água da
cidade. Tudo ia sendo colocado em novos cestos de vime e o menino ficou
esperando para ver qual cor as criaturinhas deixariam de ter se não
conseguissem mais comer vidro. Tomara que fosse vermelho, a única das três
cores que ele ainda não tinha usado.
O menino continuava trabalhando quando PP
voltou; o recado não estava mais amarrado na sua pata, mas não havia nenhum
sinal de seu João Antunes, pai de Daniel. Talvez ele ainda estivesse vindo,
pois PP era mais rápido voando do que uma pessoa andando ou correndo. Enquanto
esperava, o menino agradeçou ao urubu que voltou para o céu. Demorou, demorou e
nada do seu João Antunes chegar. Daniel já estava desistindo quando Cezinha e a
turma do bairro Educandário apareceram atrás de uma montanha de garrafas
plásticas de detergente.
Cezinha era o chefe dos meninos do bairro
Educandário. Ele e Daniel eram amigos e estudavam na mesma sala, mas estavam
“de mal” por causa de um avião de madeira que encontraram no lixão. Daniel
ficou chateado, mas não quis brigar e deixou o achado com o amigo. Agora, o
filho do seu João Antunes se perguntava o quê o Cezinha estava fazendo ali?
Meio sem jeito, Cezinha disse que viu o pai de
Daniel receber o recado do PP, mas deve ter achado que era brincadeira, pois
jogou o recado fora. Depois que seu João Antunes se afastou, Cezinha apanhou o
recado e também não quis acreditar no que estava escrito:
“Por favor, papai, venha me ajudar ou os
bichinhos beberão e sujarão de tinta toda a água do mundo! Socorro”
Cezinha disse então que se lembrou de uma coisa
muito importante: seu amigo Daniel nunca tinha lhe dito uma mentira, se estava
pedindo ajuda era porque estava em perigo. Daí, foi só juntar a turma do
Educandário e ali estavam eles. Daniel abraçou o amigo em agradecimento e disse
que precisava de ajuda para colocar os vidros nos cestos de vime.
Graças ao trabalho de todos, em pouco tempo já
não havia mais vidro à vista no lixão. Daniel pediu as seus companheiros que se
afastassem dali porque a qualquer momento chegariam as famintas bolinhas
coloridas. E não demorou para que elas aparecessem brilhando em várias cores:
vermelho, verde, laranja, violeta. Enfim, um montão de cores, menos azul e
amarelo.
Embora para Cezinha e a turma do Educandário
aquilo fosse novidade, Daniel viu mais uma vez as criaturinhas fazerem o que
mais gostavam: comer muito lixo e sujar o que deixavam. A diferença é que além
do azul e do amarelo, a falta de vidro fez com que as bolinhas deixassem de
brilhar na cor verde! Os bichinhos do lixo também estavam bem mais lentos do
que a primeira vez que o menino e seu cachorrinho as encontraram. A falta de
azul, amarelo e verde e a lentidão significava uma coisa só: o plano estava
funcionando. Eles deveriam continuar separando o lixo. Daqui a pouco não
haveria mais lixo e os bichinhos ficariam tão lentos e sem cor que não
causariam mais problemas.
Quando finalmente as criaturinhas partiram para
tomar uma nova dose de água, elas pareciam quase não conseguir voar e batiam
uma nas outras como se estivessem tontas. Daniel sentiu um aperto no coração;
no fundo, ele só queria salvar a água, não fazer mal para os bichinhos do lixo.
Reunido com Cezinha e os outros meninos, Daniel
dividiu as tarefas: para andarem mais rápido cada grupo de cinco meninos e
meninas iria para um lado do lixão procupar alguns tipos de lixo. A ordem na
qual os materiais deveriam ser coletados ficou sendo a seguinte: plásticos,
resíduos perigosos* e madeira. Antes de deixar os demais partirem, Daniel e Cezinha,
os mais experientes em mexer em lixo sem se machucarem, passaram-lhes várias
instruções.
Depois que os outros saíram para apanhar os
diversos tipos de lixo, Daniel disse para Cezinha que antes de partirem em
busca de mais lixo, deveriam pintar os cestos contendo vidro de verde; a cor
que os bichinhos perderam quando deixaram de comer esse material. Mas havia um
problema: a única cor que não fora usada na palheta dele era o vermelho, não o
verde. O quê fazer? Cezinha pediu licença para o amigo e apanhou sua aquarela,
então, pegou um pouquinho de azul e depois de amarelo e misturou tudo com água.
Sem acreditar, Daniel viu ambas as cores se transformarem em verde!!! Diante da
cara de espanto do amigo Cezinha brincou:
_ Meu pai é pintor, ué!
E lá se foram os dois também ajudar na coleta do
lixo.
O dia foi passando e conforme eles iam
escondendo os materiais dos bichinhos coloridos eles iam enfraquecendo e
perdendo as cores. Com o plástico foi o vermelho; cor que Daniel tinha na
palheta. Para os resíduos perigosos
vindos das fábricas, Cezinha usou mais uma vez sua experiência e produziu
laranja misturando vermelho com amarelo. Eles trabalharam até que só faltava um
tipo de material para separar do lixo: a madeira.
Todos corriam para conseguir esconder aquele
tipo de material das bolinhas comedoras de lixo, agora já quase sem cor,
voltassem para comê-lo. Enquanto alguns quebravam os maiores pedaços de
madeira, outros iam colocando os pedacinhos nos cestos de vime. Mas algo
terrível aconteceu dessa vez, sem aviso, as criaturinhas chegaram e perceberam
os pedaços de materias com as crianças. Como um bando de abelhas enfurecidas,
as bolinhas começaram a atacar todos que tinham madeira consigo. Não adiantava tentar
resistir, os bichinhos arrancavam todo e qualquer pedaço de madeira que viam à
sua frente.
Para piorar as coisas, as criaturas perceberam
que os vários tipos de lixo estavam dentro dos cestos de vime e começaram a
subir neles. Nos cestos azuis, amarelos, vermelhos, laranjas...
Daniel ficou desesperado, pois se elas entrassem
nos cestos, todos os seus esforços teriam sido em vão e a água do mundo se
tornaria pouca e poluída. O pobre Sapeca de tão assustado não conseguia fazer
outra coisa senão correr atrás do próprio rabo, sem nunca, claro, alcançá-lo.
om a visão de seu cachorrinhoa, Daniel teve a
segunda ideia incrível do dia. Pegou um pedaço de carvão e fez várias setas nos
cestos de vime. Acontece que, ao invés de ensinar o caminho para as
criaturinhas, as setas apontavam uma para a outra fazendo um desenho que
lembrava a Mel tentando morder o próprio rabo. E graças a isso, as criaturinhas
ficavam andando em círculo nos cestos sem jamais achar a entrada.
Sem conseguir entrar nos cestos, as criaturas
começaram a atacar com mais ferocidades
a madeira que ainda não tinha sido guardada. Vários meninos e meninas tentavam
esconder pedaços de pau cobrindo-os com o próprio corpo enquanto as
criaturinhas caminham sobre eles tentando alcançar sua refeição.
Daniel já achava que eles perderiam a madeira
quando seu pai e os outros funcionários da prefeitura chegaram. Mesmo sem
entender bem as história os adultos resolveram ajudar as crianças e guardar o
restante da madeira nos cestos de vime. Depois de muita luta o último pedaço
foi escondido. Os bichinhos comedores de lixo ainda voaram em volta dos adultos
e crianças por mais alguns instantes e depois saíram voando de maneira
desajeitada. Eles subiram, subiram, subiram e, de repente, caíram de uma vez a
muitos metros dali. Daniel ficou com lágrimas nos olhos pois entendeu que as
criaturinhas tinham morrido. A água estava salva, mas ele não queria que tivessem
destruído aos criaturinhas.
Depois que toda confusão acabou, felizmente,
ninguém estava machucado. Apenas um brinquedo, como um peão, e alguns tamancos
foram perdidos pelas crianças. Seu João Antunes, pai de Daniel, por sua vez
teve seu lindo cachimbo de madeira destruído.
“Melhor assim” – pensou.
Agora não teria desculpas para cortar o mal
hábito de fumar.
Anoitecia quando Daniel acabou de agradecer ao
Cezinha e aos garotos e garotas do Educandário. Partiu a pé rumo a sua casa acompanhado
de Sapeca e do pai. Quando perguntou ao seu João Antunes como ele o havia
encontrado, Daniel ouviu o pai dizer que quando leu o recado estava muito
ocupado e pensou que fosse brincadeira. Não estava pensando direito, então,
pouco depois, lembrou-se que o filho nunca lhe tinha dito mentira alguma.
Portanto, o perigo devia ser de verdade. Foi então que ele o achou na hora
exata.
Quando estavam quase chegando em casa, Daniel
pediu ao pai se podia fazer só mais uma coisa antes do jantar. O pai disse que
sim desde que ele fosse rápido. Enquanto o garoto saia correndo o pai disse:
_ Ah, filho, deixe os materiais nos cestos de
vime. Acho que tive um ideia para usar esse lixo separadinho...
E Daniel foi. Ele correu, correu e correu,
sempre com Sapeca à sua frente. Até que chegou em outra parte do lixão; aquela
na qual achava que os bichinhos comedores de lixo tinham caído. Após subir uma
enorme montanha de lixo ele as viu, incontáveis criaturinhas sem cor que
cobriam todo o chão daquela parte do depósito de lixo. Elas ainda se mexiam,
pulando sem direção. Parecia que Daniel estava certo, infelizmente, os pobre
bichinhos acabariam morrendo.
Com lágrimas nos olhos ele começava a descer a
montanha de entulho quando Sapeca começou a latir sem parar. Daniel voltou
correndo, olhou lá para baixo e viu que não havia mais criaturinhas sem cor. Por
alguma razão misteriosa, as criaturinhas que bebiam e sujavam a água, voltaram
a ser apenas inocentes vaga-lumes, joaninhas e borboletas.
FIM
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